Não era uma vez. Sonhos desperdiçados, a vida indo e vindo como um relâmpago que assusta até os mais fortes. Essa é a história do ser humano.
A menina caminhava pela cidade destruída com um olhar inocente. Na verdade, não sentia nada. O vestido branco estava rasgado nas pontas e sujo nas costas. Além disso, a garota estava com uma arma.
A fumaça não parava de subir. O cheiro de sangue pairava no ar e o horizonte estava tingido de vermelho. Eram os sinais de ruínas de uma pequena vila, antes insignificante; agora, inexistente.
Um gato cinza, coberto de fuligem, saiu debaixo dos escombros de uma casa.
“Gatinho! Aqui, gatinho!” disse a garota, sorrindo debilmente. “Vem aqui...”
Não adiantou. O gato eriçou os pêlos e saiu correndo.
Os animais possuem uma vida invejável: se perdem um abrigo, é só procurar outro. Pelo menos, com a maioria deles é isso que acontece. Os seres humanos se apegam a um determinado local, e preferem morrer a mudar. É a triste realidade. O gato caminhou correu pela rua na direção contrária da garota.
Uma explosão. Bem atrás da menina, que ouviu um grito desesperado de felino.
“Gatinho...” murmurou ela, tristonha, e pôs-se a chorar. As lágrimas marcavam-lhe a face suja de poeira. Ajoelhou-se e continuou chorando. No momento, era tudo o que ela podia fazer. Chorar pelo gatinho. E mais nada.
Ela não podia fazer nada.
Levantou-se, deixando no chão a pistola que estava em sua mão. Caminhou de volta para os destroços de sua casa e engatinhou embaixo de uma parede que formava um ângulo de quarenta e cinco graus com o chão. Seu pai estava ali, com metade do corpo esmagada pela parede, que caíra com o impacto da explosão.
“Papai? Sou eu, papai, vou dormir com a mamãe...” disse, sorrindo como uma criança desmiolada. “Quando acordar, chama a gente, tá...?” caminhou até outro pedaço da parede caído no chão, em cima do qual sua mãe estava. Matara-se após ver seu bebê esmagado, abaixo da superfície na qual ela jazia. Ao ver a mãe deitada, com os miolos saindo pela cabeça, a menina sorriu e passou a mão pelo rosto empapado de sangue da mulher.
“Mamãe... Cheguei... o que você vai fazer pro jantar amanhã? Espero que seja algo bem gostoso...” disse a menina, e riu tristonha, aninhando-se ao lado do braço direito, imóvel, da mãe. “Boa noite...”
Aquelas foram suas últimas palavras.